2002-11-21

O T'ao-T'ieh

Os poetas e a mitologia ignoram; mas todos, alguma vez, o descobrimos, na quina de um capitel ou no centro de um friso, e sentimos um levíssimo mal-estar. O cão que guardava os rebanhos do triforme Gerião tinha duas cabeças e um corpo e felizmente Hércules o matou; o t'ao-t'ieh inverte esse procedimento e é mais horrível, porque a desmesurada cabeça projeta um corpo à direita e outro à esquerda. Costuma ter seis patas, porque as dianteiras servem para os dois corpos. A cara pode ser de dragão, de tigre ou de gente; "máscara de ogro", chamam-na os historiadores da arte. É um monstro formal, inspirado pelo demônio da simetria a escultores, oleiros e ceramistas. Mil e quatrocentos anos antes da era cristã, sob a dinastia dos Shang, já figura em bronzes rituais.
T'ao-T'ieh quer dizer glutão. Os chineses pintam-no na louça para ensinar frugalidade.

O Livro dos Seres Imaginários,
Jorge Luis Borges.